domingo, 3 de junho de 2012

Esplendor e sepultura


Depois de algum tempo parado, decidi voltar a escrever alguma coisa num blog só meu. Andei colaborando com o Viver Paris onde, em algumas crônicas, derramei minha paixão pela capital francesa. Mas o autor do blog, meu amigo Jackson Martins, anda ocupado demais e tem deixado o blog meio esquecido. Quando ele voltar a postar, eu volto a colaborar, pois escrever sobre Paris, para mim, é como visitar mais uma vez a cidade e isso eu faço com o maior prazer. E com uma vontade louca de visitar de verdade.

Mas Paris estará longe desse blog que ora inicio, se é que isso é possível para um apaixonado pela cidade como eu. Mas, do mesmo modo que prometi a Zezé que esse blog não ia desandar a falar de política, eu prometo evitar Paris, mas não para evitar discussões muitas vezes inúteis, mas por puro receio de enfadar os - já prevejo - poucos leitores que terão a paciência de acompanhar essas mal traçadas.

Dia desses, conversando com uma amiga, lembrei de uma professora de português lá do Culto à Ciência, no tempo em que aprendíamos a nossa inculta e bela com uma gramática do Paschoal Cegalla e a literatura no Flor do Lácio de Cleófano de Oliveira. Não, não era colegial ainda, era o ginásio, o quinto ou sexto ano na escala atual.

Quem não conhece o Flor do Lácio não sabe o que perdeu ao não viver aquele mundo estranho, nebuloso, fantástico e surpreendente dos primeiros passos na literatura. Quantos anos tínhamos? 12, 13 por aí. E aprendíamos, logo de cara, que nossa língua "última flor do Lácio inculta e bela" era "a um tempo esplendor e sepultura". Lácio - e eu nunca mais esqueci - era a região primeva dos romanos (Lazio, hoje) e ali o latim ganhou forma e, depois, pariu as derivações. E o português foi a última delas. Inculta e bela. Esplendor e sepultura. É mole? Pois era desvendando sonetos como essa obra prima de Olavo Bilac que iniciávamos a caminhada, cheios de temores, pelos infindáveis túneis da literatura luso/brasileira.

Não me lembro de como o assunto surgiu - estávamos almoçando num delicioso restaurante em Joaquim Egídio, com mesas no quintal - mas sei que a amiga, jornalista como eu, meio que babou de inveja por eu me recordar, com tanto carinho e, claro, com um orgulho danado, do meu tempo de ginasiano no Culto à Ciência. E declamar os primeiros seis versos do soneto. Depois fiz o curso Clássico (fui da última turma, depois juntaram o Clássico e o Científico no tal do Colegial) ali mesmo e saí de lá certo que minha vida profissional estaria ligada, de alguma forma, à língua. Claro que pensei em ser professor de literatura, mas os caminhos que percorremos, as escolhas que fazemos no percurso acabam nos levando a um destino que, sim, escolhemos, mas que, mesmo assim, nos surpreendem.

Eu que passei a adolescência e a juventude sob uma ditadura militar, de repente estava num jornal escrevendo reportagens sobre a vida política de Campinas. Isso em 1977, quando já se vislumbrava uma tênue luz no fim do túnel ditatorial e havia um pouco mais de liberdade para se escrever. De lá pra cá, foram muitas redações e toneladas de letras, linhas, parágrafos, vírgulas e pontos finais.

Agora, os 60 anos, ainda na ativa, animado por uns papos com amigos e incentivado pela Zezé, resolvi cometer um blog em que a memória vai ser exigida ao máximo. Serão histórias que vivi, que não vivi, que gostaria de viver, que odiaria ter de viver, que odiei ter vivido e que amei ter vivido. A crônica, penso eu, é a literatura possível nas páginas de um jornal, uma espécie de literatura metida à besta. Mas, por caber nela doses de realidade cotidiana misturadas a imaginações possíveis e impossíveis, é que nela me encaixo. Tudo que estará escrito por aqui terá como base a verdade, mas ela pode se misturar à imaginação e aos desejos e se impregnar de dúvidas, de sobressaltos, de surpresas e contradições. Afinal, nenhuma vida passa incólume pela Terra.

12 comentários:

  1. Ah, mas eu estudei Literatura no (livro do) Alfredo Bosi, já no Colegial, é verdade, em aulas inesquecíveis com um professor que até hoje é meu amigo...
    Mas indo ao que interessa, acho que não poderia haver início mais promissor, para o blog, do que começar com uma declaração de amor à "ultima flor do Lácio", tão incrível e, atualmente, tão descuidada.
    Vida longa ao "Crônicas ao Léu"!
    Monica

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  2. Bacana, Edmilson. Admiro a disposição. A amostra foi boa. Vamos acompanhar e, surgindo a oportunidade de comentar de forma colaborativa, fa-lo (epa)-emos com prazer (epa!). Abraço!

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  3. Parabens, jornalista Ed, teu blog com certeza será, na atual versão, tão bom ou até melhor do que o outro. Estou à disposição, terei muita honra em ser colaborador. Aliás, tenho uma cronica sobre a Última Flor do Lácio. Não o livro em pauta. Mas a própria. Grande abraço.

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  4. Leopoldo Nizam Pfeilsticker4 de junho de 2012 às 08:41

    É isso aí Ed, fico feliz com seu blog. Serei um dos muitos que o acompanharão.

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  5. Parabéns Ed! Sorte e sucesso. E muito obrigada por esse espaço, adoro seus textos, seu estilo. Abraços. Bia

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  6. Renata Frigéri Freitas dos Santos4 de junho de 2012 às 10:26

    Oi, tio Ed! O blog já está nos meus Favoritos, adorei o primeiro post, prefiro os não ligados à política (obrigada, Zezé!). Beijos, Rê.

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  7. Ed – manda ver , parabéns e sucesso !!

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  8. Já adicionei seu blog aos meus favoritos, te desejo muito sucesso. Abraços.

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  9. Legal, Ed. Vou acompanhar esse blog de suas verdades vividas, não vividas, desejadas e indesejadas. Abração!

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  10. Oi mano, adorei o blog "Crônicas ao Léu". Ver a capa do "Flor do Lácio" me trouxe inúmeras recordações. Ainda tenho o meu exemplar do tempo do ginásio no Instituto de Educação "Carlos Gomes", acredita?
    Parabéns! Sucesso! Beijo Sylbene

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  11. Muito bom, Edmilson, você ocupar este espaço. Espero lembranças da Vila Industrial. Um abraço. Chiquino.

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