domingo, 29 de julho de 2012

A mulher do Errol Flynn


Antonio Contente

Recebo e-mail do jornalista José Leal Paes, hoje morando em Belém após trabalhar durante bons anos no “Estadão”. Sua mensagem não poderia ser mais sucinta, apesar do enorme significado. Dizia, apenas: “Morreu aqui ontem, no bairro do Guamá, a mulher do Errol Flynn”.

Devo contar que fui, imediatamente, coberto pelo diáfano manto da saudade. Pois tal figura, a “mulher do Errol Flynn”, marcou de alguma forma a vida de todos nós que fomos jovens na Capital do Pará ali pelos anos cinqüenta.

Raimunda Bastos, esse era o nome dela. Morena bonita, francamente bonita, sósia da bela Teresa Collor. Mas a nossa beldade não era nenhuma socialite, antes pelo contrário. Exercia, com eficiência e alta competência, aquela que chamam de “a mais antiga das profissões”. E, afinal, mesmo sendo a gracinha que era não teria entrado para a história se não tivesse se transformado na “mulher do Errol Flynn”.

Vamos voltar um pouco no tempo, para a época da Segunda Guerra Mundial. Naqueles duros anos, os americanos instalaram duas bases no Brasil, uma em Natal outra justamente em Belém. E ambas eram, de vez em quando, visitadas por grandes astros e estrelas de Hollywood, que ajudavam a levantar o moral das tropas. Foi assim que passaram pelo país figuras como Lana Turner, Humphrey Bogart, Kirk Douglas, Gary Cooper, Bob Hope e, claro, Errol Flynn, entre muitos outros.

Pois muito bem, o ator do “Robin Hood” dirigido por Michael Curtiz, acho que em l938, chegou a Belém a bordo do seu iate particular. Vinha acompanhado de certo staff, e até algumas gurias, só que, ancorado ao largo do porto da cidade, o ator resolveu, certa noite, visitar a zona do meretrício. Mandou para a melhor pensão do chamado “quadrilátero do pecado” um grupo precursor, a fim de organizar tudo. Tanto que, quando chegou, de porre, todas as garotas da casa, fechada especialmente, permaneciam colocadas de costas para a parede da sala, a fim de que o grande astro apontasse aquela com quem ficaria. Dito e feito, a escolhida foi Raimunda Bastos, que ele levou para o quarto e lá ficou até a noite do dia seguinte.



A grande verdade é que as muitas horas de amor com o famoso galã transformaram completamente a vida da moça. Tanto que quando a conheci, muito tempo depois, já nos anos cinqüenta, ela permanecia na mesma pensão, e fora batizada como “a mulher do Errol Flynn”. Por causa disso só atendia a seleta freguesia. Muitos vinham dos Estados vizinhos para, digamos, merecer seus favores.

Pintando, afinal, a decadência, os tempos ficaram mais duros, porém a moça não perdeu a classe. Tanto que certa noite, já nos anos 60, vi a reação dela diante de um marinheiro bêbado que queria arrastá-la para a cama:

-Tá pensando o quê, idiota? Tu achas que essa bainha aqui, onde o Robin Hood enfiou a espada, vai se passar para um tipo da tua laia?

Grande Raimundinha, “a mulher do Errol Flynn”. Morreu rondando os 90 e lá vai fumaça, na casa comprada com os dólares que o ator lhe deu, na lendária noite. Saudades eternas.

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